As leis e regulamentos mudam com muita frequência, e é preciso muito conhecimento para se adaptar e conseguir chegar a um ritmo de trabalho consistente. Para ajudar grandes empresas, convidamos a Consultora Fiscal Saska Lins para uma entrevista, onde ela dá dicas valiosas sobre gestão fiscal e conta sobre as tendências para o futuro do campo tributário.

Conheça um pouco mais sobre ela e confira toda a entrevista, garantimos que essa leitura pode esclarecer muitas dúvidas!

Primeiro, fale um pouco sobre você e sua experiência com gestão fiscal.

“Meu primeiro contato com a área contábil foi em 1995, no segundo grau, estagiando na área de custos e CPD (Central de Processamento de Dados) que hoje chamamos de TI (Tecnologia da Informação). Depois foi em 2002, quando morava em Maceió-AL e naquela ocasião fui contratada para ser supervisora do Call Center SEFAZ-AL, ou Plantão Fiscal. Por 2 anos, tive contato com o dia a dia dos fazendários e dos contribuintes, sempre buscando uma solução para ambas as partes. Depois dessa experiência continuei pela área financeira, até por conta da minha formação na época, que era Gestão Financeira e Gestão Econômica e Orçamentária. Mas já trabalhei na área de vendas, estoque, faturamento, caixa, administração, contas a pagar e receber, até que em 2006, quando estava fazendo minha primeira pós-graduação (auditoria, perícia e controladoria) foi que me apaixonei pela contabilidade e não dormia pensando em outra coisa: eu tinha que fazer Ciências Contábeis. Não sosseguei até que em 2007 entrei no curso e em seguida fiz minha transição de carreira do financeiro para a contabilidade (que não é tão transição assim, se considerar que a contabilidade faz parte do universo financeiro).

Trabalhei em escritório de contabilidade e aprendi muito, comecei na área contábil e depois fui para o fiscal. Em 2010 tive meu filho e então uma parada profissional por conta da licença maternidade, e quando voltei em meados de 2011, já voltei para Indústria. Trabalhei no recebimento de fretes e depois encarei meu primeiro desafio na área fiscal, e pouco tempo depois eu coordenava a área. Lidei com sistemas, representantes, vendedores internos, custos, contabilidade, financeiro, logística... além de aprender todo o tipo de obrigação acessória, de exceção fiscal, de atender fiscalizações, auditorias... foi a minha melhor escola. Em 2013 decidi seguir carreira ‘solo’, e passei por multinacionais, outros segmentos de indústria - da pequena à grande, fiz palestras, fiz ‘freela’, dei cursos até que cheguei nas consultorias. Em 2016, tive uma experiência com auditorias eletrônicas e outros projetos se abriram como a recuperação de crédito. Aqui considero que foi uma nova escola, tive a oportunidade de entrar para a consultoria especializada e trabalhar em projetos muito específicos como CAT 207 e CAT 83 (SP), auditoria de Bloco K e hoje com RECOF-SPED de grandes empresas.

A experiência é individual para cada um, eu considero que ter passado primeiro pelo escritório de contabilidade, me abriu a cabeça para várias situações. Lidar com o mesmo prazo para dezenas de empresas ao mesmo tempo é ‘insano’ considerando que uma pessoa pode ter até 50 empresas na sua carteira (e até mais!) de diferentes portes e segmentos (a divisão sempre depende de como a empresa trabalha).

Numa indústria a demanda é diferente, mas não menos exigida. Afinal a empresa pode comprar e vender para todo o Brasil, pode ter produtos beneficiados com regime especial, pode importar, exportar, ter várias filiais, pode ser multinacional, enfim... as variáveis são grandes e é por isso que tudo ‘depende’.

E ainda tudo isso que eu citei acima pode variar conforme o que a empresa – tanto indústria quanto a de serviço – tem de ferramentas e recursos disponíveis para você trabalhar.”

Quais são as maiores dificuldades na gestão fiscal e tributária que você percebe nas empresas hoje em dia?

“Para ser bem direta, no meu entendimento eu diria: cenário tributário e gestão de pessoas.

- Cenário Tributário: Falar que o sistema tributário do Brasil é complexo nem chama mais atenção, já é um mantra! Coisas que a gente se acostuma a falar e a conviver. O cenário tributário do Brasil é um caos, fato.

Cheio de remendos, exceções, disfunções do tipo base dupla de DIFAL ou DIFAL interno. São exceções à regra. Aliás, só trabalhamos com as exceções. Costumo brincar que quando a gente precisa de mais de 2 pessoas para interpretar um texto, tem algo errado. Não por acaso existe um mercado em volta dessa complexidade para sanar problemas de tempo e de processos: Consultorias, sistemas, advogados, contadores, etc... e um dos maiores contenciosos tributários. (cerca de 75% do PIB – dados de 2019 https://www.conjur.com.br/2021-jan-22/contencioso-tributario-alcancou-75-pib-2019-pesquisa)

Temos os tributos federais, estaduais e municipais. São 27 legislações estaduais (DF + 26 estados), 5.570 cidades! Ao todo são 92 tributos vigentes no Brasil atualmente, com todas as suas variações e exceções possíveis. Competências diferentes, obrigações acessórias diversas, multas, prazos, soluções de consulta, entendimentos diferentes... São mais de 2,14 normas tributárias por hora/dia útil (veja os dados aqui https://www.migalhas.com.br/arquivos/2019/10/art20191025-11.pdf) Haja técnica, tempo, saúde e muito “Compliance” para lidar com tudo isso!!

Definitivamente não temos um ambiente amigável!

Sem contar que esse setor fiscal/tributário tem a capacidade e potencial de detectar oportunidades e economias tributárias. Por isso muitas empresas inclusive têm mudado o nome dessas funções para ‘Estrategista Fiscal/Tributário’. Essa é uma das tendências.

O gestor tributário além do ‘caos’ externo e de suas aptidões técnicas, têm muitas vezes que ‘gerir’ a si mesmo quando se trata de suas próprias habilidades: estar atualizado na legislação, estar de olho nas atualizações e propostas tributárias que acontecem no cenário político, ter desenvoltura para lidar com seus clientes internos, ter conhecimento em ferramentas tecnológicas, construir cenários tributários e indicadores, lidar com auditorias, fiscalizações, apresentações, reuniões, enfim, até que precisa ter maestria comportamental. E assim chegamos à gestão de pessoas.

- Gestão de pessoas: ué, mas o que isso tem a ver com a gestão fiscal/tributária? Na verdade tem tudo a ver! Gerir pessoas é considerada umas das 5 softs skills mais importantes para o futuro!

O famoso ‘trabalhar sob pressão’ não é mais o suficiente e estamos em tempos em que as pessoas com características sociais e emocionais mais agradáveis tem mais oportunidades.

O que isso significa na prática? É simplesmente a maneira de como lidamos com os problemas, desenvoltura, organização, nossa forma de expressão e comunicação. São características que dependem de cada pessoa obviamente, mas tem tudo a ver com a maturidade emocional do indivíduo. (Lembra das diversas palestras sobre inteligência emocional?).

Esse tema é tão importante que um estudo realizado pela Deloitte Access Economics prevê que um terço das empresas vão ter Soft Skills como prioridade até 2030.

Particularmente, acho que é um assunto que ainda precisa de muito cuidado quanto a uma possível avaliação duvidosa dessas situações. Precisamos que profissionais de gestão de pessoas da corporação consiga avaliar de forma correta essas características.

Gerir pessoas, equipes, times requer sim maturidade, experiência e acima de tudo transparência e comunicação clara e aberta. A maior parte dos problemas está nos relacionamentos entre líder e liderado.

Comunicação clara evita por exemplo expectativas e achismos. Quando todos estão na ‘mesma página’ o sentimento é de um time, de objetivo comum. E todo aquele trabalho que o cenário fiscal do Brasil traz para a rotina fica menos ‘estressante’.”

Tome nota: aqui no blog da ConexãoNF-e a Saska Lins já publicou um artigo especial sobre o assunto: Skills do profissional de Gestão Tributária.

Os gestores estão preparados para lidar com a tecnologia e rápidas mudanças?

“De maneira geral sim. Temos profissionais no mercado muito bons e super antenados nas tecnologias disponíveis e trazendo essas soluções para dentro das empresas onde trabalham. Até mesmo porque nossa RFB também está tecnológica. Vide relatório anual de fiscalização da receita federal.

O que eu vejo, no entanto, é que estamos sendo ‘afogados’ pelas mudanças legais, meio sem tempo de digerir tanta coisa. Temos que viabilizar na prática todas as alterações legais em tempo recorde. E aqui também estamos falando das empresas de softwares que precisam caminhar juntas com as empresas em geral. Tem muita coisa acontecendo e dá impressão de que as coisas saem de repente. Mas não é. O gestor tributário precisa estar nessa mesma velocidade para garantir o mínimo risco possível nesses casos.”

Para as grandes empresas, o que é mais importante ter em mente sobre gestão fiscal?

“Para as grandes empresas eu diria que ter um processo bem definido é muito importante. A gestão fiscal precisa ter um ordenamento, justamente pelas coisas que eu citei acima. Não dá para ter um caos lá fora e também dentro da empresa... as coisas simplesmente não andariam.

A primeira coisa de tudo é mapear o SEU cenário tributário.

De forma bem prática: É saber o que a empresa faz (sua atividade econômica, seus insumos, características de produção, produto final). Então você mapeia seus fornecedores (de onde eles são? Quais estados, países?). Então mapeia os clientes (de onde eles são?). Quais benefícios fiscais estão disponíveis para o produto? Para a região onde estou? Depois você faz um levantamento de todos os itens entrada e saída, com NCM, carga tributária, exceções estaduais e federais, levanta as obrigações acessórias, seus prazos e vencimentos. Reveja o custo! O preço de venda!

Se quiser ir além aqui mesmo você já pode começar a levantar seus indicadores.

Com esse cenário levantado você pode traçar estratégias fiscais do tipo: estou escoando meu produto por um estado que contempla benefício fiscal ou não? Seria mais vantajoso comprar internamente ou importar?

Uma boa gestão fiscal, e eu diria que aqui podemos sim dizer que é uma estratégia fiscal eficiente, pode trazer uma visão antecipada para cenários de investimentos, para possíveis pleitos de incentivos fiscais, uma possível reorganização societária e até mesmo um novo enquadramento tributário, recuperação de tributos, e não menos importante: eliminação do retrabalho e multas.

Claro, tudo isso aliado à tecnologia. Eu cito como exemplo o uso de ferramentas de BI – Business Intelligence onde é possível modelar e analisar um grande volume de dados em pouco tempo conforme a necessidade. Eu usei muito desde 2016 quando nem era conhecido e digo com toda a certeza que otimiza o tempo de análise de uma forma padronizada e com mais assertividade!”

Quais são as tendências para o futuro no campo tributário?

“Em 2020 a TAX TALENT divulgou uma pesquisa com as tendências tributárias, e isso foi antes da pandemia. Naquela ocasião, o cenário era bem otimista e previa falta dos profissionais de tributos por 2 motivos:

Reforma Tributária Mundial – falta de profissionais especializados por conta da reforma tributária que estava acontecendo em vários países ao mesmo tempo, e isso implicava em ter profissionais para lidar com as demandas de uma economia aquecida. E aqui para saber mais você precisa estar ligado no cenário internacional, eu costumo acompanhar pelo site da OCDE.

Sucessão Fiscal - E em segundo lugar, já existia uma preocupação com a sucessão fiscal desses profissionais uma vez que os mais experientes são da geração ‘baby boomers’ (nascidos entre 1945 – 1964 pela classificação americana). Sendo assim, com as aposentadorias iminentes, não estava havendo um repasse que retivesse o sucessor na empresa garantindo a continuidade dos trabalhos, o que levaria cada vez mais jovens assumirem altas posições mesmo sem ter tanta experiência. Essa é uma preocupação real e está nesse artigo que escrevi ano passado https://www.linkedin.com/pulse/sua-dor-de-cabe%C3%A7a-nos-impostos-n%C3%A3o-%C3%A9-o-que-voc%C3%AA-pensa-saska-lins/

Para 2021 o cenário não mudou tanto assim, a preocupação com a sucessão é real e deve ser olhada com bastante zelo pelas empresas.

Além dessa lista, eu reforço que a gestão fiscal ficará cada vez mais tecnológica. Sem querer levantar nenhuma polêmica com relação a automatização de tarefas – a temida inteligência artificial – já é uma realidade e já está sendo usada por muitas empresas. Portanto eu diria que cada vez mais o setor fiscal ficará estratégico no sentido de analisar cenários e apontar soluções do que gerando dados.

Aliás, a mais cobiçada ‘moeda’ do mundo se chama dados. Isso significa dizer que temos mais oferta de ferramentas que facilitem esse processamento e que possibilitem entregar o que eu preciso analisar em menos tempo, com menos margem de erro (desde que parametrizadas corretamente) e assim mais cedo eu antecipo cenários, tanto bons quanto ruins.”

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